quinta-feira, 17 de novembro de 2016

Agenda de Volke - Bloco de Anotações - parte 2

As informações coletadas a seguir foram transcritas à risca de um dos blocos de anotações de Eliah Volke. O, provável, jovem escritor tem seu paradeiro desconhecido, entretanto, antes de seu desaparecimento, ele nos presenteou (através da excêntrica mania de escrever tudo que presenciava) com informações preciosas sobre coisas que nenhum outro indivíduo conseguiu testemunhar, até o determinado momento.

É importante salientar que o bloco de anotações estava deteriorado quando o achamos e que algumas páginas foram perdidas, enquanto outras puderam ser restauradas através de magia e muita paciência. O conteúdo mostrado a seguir ainda permanece cercado de mistérios e dúvidas.

Duas páginas de anotação deterioradas que antecipam a seguinte leitura, foram perdidas, tornando parte do entendimento confuso e, talvez, até mesmo, desconsiderado.

... minha impressão é a de que tudo que passei até me livrar das engrenagens não havia sido o bastante e não importa o quão cansado e ferido eu estava, senti como se estivesse sendo poupado. Seria tolice, entretanto, agradecer ao nada... ou ao tudo. 

Não senti minhas pernas. Qualquer um ficaria em estado de choque ao ver os pés esmagados e retorcidos como os meus estavam. Parecia que eu havia acabado de sair de uma máquina de tortura, daquelas das mais antigas e cruéis. Sentia que minhas costelas não estavam em melhor estado e o meu fôlego demorava a acalentar a garganta. Eu iria morrer, é claro. E, nem assim, o medo tomava conta de mim. Então, olhei para minhas mãos e, acho que, em toda minha vida, nunca havia expressado um sentimento que chegasse tão próximo do pânico - embora, realmente, eu não saiba do que estou falando - as lágrimas brotaram aos borbotões em meu rosto, acumuladas pela tristeza de ter perdido meu instrumento de ofício. Onde estavam meus dedos?

Apenas quando minha vista se limpou, notei que estava suspenso em uma mesa alçada por correntes e engrenagens e que haviam tantas outras ao meu redor. Tinha outras vítimas comigo. No mesmo estado. A voz mal conseguiu ecoar pela minha boca, mas, finalmente pude gritar "Socorro! Alguém aí? Me ajude!" e o som se propagou na sala que aparentava quilômetros de extensão.

- Olá, experiência!

Aquela voz infantil e cavernosa chegou aos meus ouvidos...

- Você já pode se mexer? Incrível! Em menos de 24 horas!

- Quem é você?
Era um anão. Pelo menos aparentava ser. Tinha longas barbas negras, um par de óculos garrafais no rosto, um nariz protuberante, dentes amarelados e um corpo robusto, porém bastante ágil e eficiente. Ele estava escalando as correntes com a mesma facilidade que um macaco pula entre os galhos de uma árvore.

- Bem vindo de volta à vida! Sou Ingram, um ansioso contemplador das artes de meu senhor, o Barão da Máscara de Ferro!

- O Barão... ele... ele fez isso comigo!

- Ora, mas, espere... você ainda está sangrando!?

- Como não poderia sangrar? Veja o meu estado! A dor é lancinante!

- Não... você não entende. Forjados não sangram. Não lidamos com necromancia, aqui é... outra coisa...

- Do que está falando?

- Da magia mecânica, seu estúpido! A magia do futuro! Alguma coisa deve ter dado errado...

- Por favor, me ajude. Minhas mãos... eu... eu preciso delas...

- O que poderia ter dado errado, oras?

- Você está me escutando? Eu não sinto o meu corpo, apenas essa dor...

- Os fusíveis estão ligados aqui. Toda a aparelhagem está nos quites...

- O que você está fazendo aqui? O que o Barão mantém em segredo?

- Um segredo!? ...Hum... Não se preocupe com isso. Logo, isso não será segredo pra ninguém! 

Ele disse isso com um sorriso estúpido no rosto e eu pude vê-lo desaparecer da minha vista.
- Espere! Por favor, não vá!
Mas, ele ainda estava ali, tateando algum coisa mecânica embaixo da minha mesa e... girando. Girando uma manivela enferrujada que fazia minha mesa de "experiência" se movimentar lentamente. O meu corpo estava sendo erguido. Pude sentir o sangue, ainda quente, banhar o meu resto de corpo. 

A mesa inteira ficou de ponta à cabeça e, então eu vi aquilo...

- Viu só? Não tem como o barão esconder isso por muito tempo!

Eu estava a muitos e muitos metros do chão, preso à esta mesa junto com dezenas... não! ... CENTENAS de outros cadáveres que estavam na mesma situação. As paredes recheadas de engrenagens sustentavam correntes e mecanismos que elevavam incontáveis outras mesas de experiência. Um ar quente jorrava nuvens de fumaça rápidas que nublavam o ambiente e demorou para notar que, no meio daquela densidade, ali estava sendo praticado o maior e mais prepotente ofício que um humano poderia exercer nestes tempos.

- Eu... eu... estou curioso. Me conte mais!

[...]

Ingram. Rabiscos encontrados no bloco de anotações de Volke.

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